A moda na web

Nos Estados Unidos, o segmento de modas e acessório é líder em vendas com algo como 14% do faturamento de e-commerce ou US$ 25 bilhões. Por aqui, o hábito e a cultura de adquirir itens com essa característica pela web ainda é uma novidade, mas a partir da ascensão de 2009 para o ano passado, quando o mercado, até então marginal, saiu da 20a posição no ranking setorial de vendas, para a 6a colocação, ele passou a chamar a atenção.

“Os gestores locais começaram a ver benchmarks do exterior e ao mesmo tempo viram que quem investiu localmente estava conseguindo bons resultados, o que provocou um movimento forte de investimentos em projetos no último ano, algo que continua agora”, aponta Marcelo Povoa, sócio da MPP, agência digital que trabalha em projetos do setor como o tocado para as marcas Cantão, Redley e Kenner, todas do mesmo dono.

Para o empresário português David Bernardo, CEO da HiPXiK, um clube de compras multimarcas na web, o Brasil ainda está na fase inicial do e-commerce de moda. “Vejo algo semelhante ao mercado europeu, com os negócios se iniciando pelos clubes de vendas privadas para depois haver uma conversão de sites próprios das marcas. Mas vejo muitas empresas do setor buscando a migração”, observa.

Mas o que explica a ascensão de vendas e representatividade do setor em 2010? O primeiro fator é o fenômeno dos clubes de compras e dos sites de ofertas coletivas, o outro é a presença do varejo com seu braço de moda. “Esse salto aconteceu principalmente devido aos projetos online dos grandes varejistas de moda do país como Renner, Pernambucanas, Marisa etc. Para 2011, sabemos que praticamente todas as marcas de expressão já têm ou estão desenhando suas estratégias on-line”, avalia Flávio Pripas, sócio fundador do byMK, uma rede social ligada ao setor de moda.

No entanto, o executivo da MPP admite que o setor exige estudo e maior planejamento que outras áreas, e tenta explicar a demora de atenção para as lojas virtuais. “Existem complexidades e custos, e isto também explica o conservadorismo do setor e sua demora em investir. A logística é uma grande barreira e montar a loja virtual pode ser muito mais trabalhoso que uma loja física. Além disso, nos últimos anos o varejo teve vendas aquecidas e isso também freou um pouco os investimentos na web”, argumenta.

Experiência e foco

Uma saída para as marcas que queiram experimentar o “jogo” antes de investir de forma mais concreta ou mesmo aquelas que não têm recursos para investir de forma independente é a dos clubes de compras ou shoppings multimarcas virtuais. Um desses exemplos é o HiPXiK, que utiliza o conceito de clube de compras para criar uma base de dados e gerar fidelização dos clientes. Além do Brasil, a marca opera no México e seu gestor Bernardo também já tinha trabalhado na concepção de um projeto do gênero em seu país natal, Portugal.

Presente no Brasil desde agosto de 2010, o clube planeja chegar aos 2 milhões de usuários até o final do ano. Porém, antes de iniciar sua operação, a empresa estudou o potencial de consumo online e direcionou o portal ao atendimento às classes A e B. Para se aproximar desse público, firmou um acordo com a Gol, no qual tem acesso aos participantes do Programa Smiles, oferecendo novidades e descontos nos produtos presente no site.

Quanto à estratégia de trabalhar nos segmentos A e B, Bernardo admite que isto não quer dizer que não seja possível descer na pirâmide, mas sim um posicionamento inicial. “As marcas que trabalhamos também têm esse perfil. Temos que ter um foco”, explica.

Estratégia chique

Como diferencial, a HiPXiK trabalha não apenas no segmento de descontos, como também pode fornecer toda a operação de e-commerce para grandes marcas de moda, gerindo a operação por meio do seu conceito de ‘e-commerce 360º’. O foco evolui da gestão de toda a operação de cada marca presente no portal, cuidando do marketing, estratégia, Business Intelligence, Customer Services, ciclo de vida do produto, estrutura, logística, entre outros recursos fundamentais no processo de venda, até a retenção e a fidelização do e-consumidor.

“Começamos com o beta em agosto de 2010, e agora estamos na fase de operação full speed. Já temos, inclusive, uma boa audiência com a base de Smiles”, garante Bernardo. Ele revela que precisou tropicalizar a estratégia por conta dos regimes fiscal e tributários locais, o que exigiu mudanças no backoffice do projeto trazido do México. A empresa chegou a contatar um parceiro local, mas acabou por desenvolver tudo internamente com o seu time de 10 programadores, dos quais quatro no Brasil e o restante baseado no México.

O HiPXiK atualmente trabalha com 500 marcas, e a estratégia é fruto do trabalho de Bernardo com suas sócias, Elizabeth Potter João Silva e Esmeralda Dourado – ambas com atuação no mercado de luxo e moda. O clube conta ainda com a ajuda de um time de especialistas que traduzem o posicionamento de crescimento da marca.

A expectativa é chegar aos R$ 50 milhões de faturamento em 2011. Para isso, além do planejamento com base na atração de investidores e lançamentos de novas marcas no Brasil, a HiPXiK está investindo fortemente em ações de marketing digital como links patrocinados, busca orgânica (SEO), redes sociais (twitter e facebook), emails marketing promocionais, concursos culturais em social media e Adnetworks. “O investimento em redes sociais é o mais crítico nessa estratégia”, garante.

Modelos na prática

No entanto, cada projeto tem sua especificidade, barreiras e mesmo facilidades. Afinal, uma marca pode possuir um posicionamento na classe B para baixo ou mesmo C. E mesmo a entrada na web, seja independente ou nos clubes ou shoppings multimarcas precisa ser pensada. “Um segmento como o de luxo, por exemplo, tem outras peculiaridades na sua própria experiência de compras. As grandes marcas resistiram a entrar até mesmo nos Estados Unidos”, aponta Povoa.

A razão para a resistência do luxo era que a web poderia retirar o componente de emoção e de ambiência das lojas, com atendimento VIP etc., que garante uma experiência diferenciada. A saída encontrada por algumas marcas como a Gucci e a Valentino foi trazer esse conceito de exclusividade e inovação para a Internet. “Integrar os clientes por meio da loja física e das redes sociais, fechando grupos ou clubes exclusivos, traz uma verdadeira “competição” pelos itens, com todos querendo ter aquilo que é comentado. O que trouxe grandes resultados para as empresas”, explica Povoa.

Faz parte dessa estratégia investir em experiências chamadas de sensoriais, extrapolando a venda da web ao mero “catálogo” de produtos. Customizar o site ao máximo, ter modelos desfilando online e de forma exclusiva faz com que a experiência seja mais rica. Assim como explorar as redes sociais e usar da ideia de clube exclusivo da marca. “No fim o custo é alto, mas o ticket médio pode em alguns casos ser até superior ao das lojas físicas”, admite o executivo da MPP.

Para 2011, a e-moda, como podemos chamar o comércio eletrônico do setor, pode ganhar mais massa crítica e resultados e experiências interessantes para as marcas e mesmos os clubes e shoppings virtuais. Em resumo, o ano promete que o segmento terá resultados concretos quando falamos em e-commerce e não um “mero modismo”.

Experiência “social fashion”

Criado pelos profissionais especializados em tecnologia Flavio Pripas e Renato Steinberg, que trazem cerca de 15 anos cada de atuação no setor, o portal byMK nasceu de uma brincadeira e, surpreendentemente, chegou a 2 mil usuários em oito meses. O número fez com que os profissionais passassem a dedicar seu tempo, de maneira integral a rede social. O resultado: em 6 meses o site saltou para 40 mil usuários, ou seja, um crescimento de mais de 1000% no número de cadastrados.

“Podemos fazer uma analogia com o Orkut, só que da moda. Os usuários se cadastram e criam comunidades de interesses em comum. Eles interagem, trocam experiências, montam seus looks e tornam seus projetos disponíveis na rede. Essa experiência tem sido fundamental para os interessados nesse universo”, explicam os sócios Flavio Pripas e Renato Steinberg, do byMK.

O byMK oferece cadastro gratuito e, após o registro, o usuário da rede tem a possibilidade de criar looks com imagens de roupas, sapatos e acessórios disponibilizados no site. Uma espécie de consultoria de moda virtual.

No portal, a interação acontece por meio de comentários nos looks e interações nos grupos de discussões, como na maioria das redes sociais disponíveis na web. As criações dos usuários podem ainda ser publicadas e avaliadas pela comunidade. No byMK é possível ainda incluir novas peças para montagem de looks, adicionar marcas favoritas e criar uma rede de amigos a partir dos interesses em moda.

Os usuários passam em média 40 minutos interagindo na rede e 96% de seu público é feminino. Em cada acesso, cerca de 28 páginas são visitadas. A expectativa é que até o final do ano, mais de 110 mil pessoas já sejam usuárias registradas no byMK. E para monetizar o projeto, o byMK lançou recentemente uma plataforma de publicidade de moda que permite aos lojistas, designers, estilistas e outros interessados divulgarem os seus produtos.